sábado, 26 de abril de 2008

Hoje Os Números Quiseram Ser Um Fruto Tropical

O sol queimava-me a face com delicadeza. Havia já muito tempo que não me queimava assim, firmemente e no entanto docemente, como um beijo de embalar. O livro de Matemática estava a aborrecer-me, a verdade é que tinha uma vontade enorme de sair dali e mergulhar naqueles campos que avistava da janela, esquecer-me dos números e de todas as responsabilidades do dia-a-dia. A janela entreaberta estava a enlouquecer-me, queria fugir dali e respirar a brisa que se fazia lá fora, a humidade do ar lá fora. Estava farta de estar ali presa como se mais nada houvesse senão os números, aqueles pequenos símbolos que batiam sempre certo, que eram sempre exactos, que não havia forma de se enganarem. Por mais que eu tentasse o resultado era sempre o mesmo, tudo dava certo ali, por mais voltas que eu desse não havia forma de os enganar, eram sempre eles os donos da razão. Num impulso fechei o livro, e levemente os olhos também. Respirei o ar de dentro de casa, era seco e sufocava-me. Levantei-me com receio, mas agora já não ia parar mais. Abri a porta e uma doce brisa embalou-me o corpo. Era quente, e o sol agora brilhava mais do que sempre, era ele o dono da razão agora e não mais os números do meu livro de Matemática. Caminhei pela rua que se desenhava à minha frente, sem saber onde me levava, e acarinhava as flores com a palma da minha mão. Eram suaves, com um pequeno aroma a doce e a vida, a liberdade também. Olhei para o céu, e estava agora mais azul. Celestial deveras, e pequenas nuvens como se bolas de algodão pintavam-no. Era o mais belo quadro de sempre.Respirei fundo e pensei que dali a umas horas as consequências iriam chegar, que aquilo era somente um bom momento sem nada de produtivo. Baixei a cabeça, caiu-me sem forças, mas de repente avistou cor. Uma flor estava a querer nascer, pequenos rebentos coloridos começavam a querer viver. Era uma flor de Maracujá, e por muito nova ou inexperiente que fosse, tinha muito mais razão e beleza do que um Pi Matemático.


P.S. Não vou mais procurar a razão das coisas, porque quando olhei para o céu naquele dia, soube que tudo é o que parece.

3 comentários:

Anabela Magalhães disse...

Que beleza de texto, que beleza de título, que beleza de final!!!! :)

Anónimo disse...

E dedicado a mim.
Quem diria.

R. Branco disse...

O melhor. O melhor.

Lindo