terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Emma Johnson.

Gostava de perceber o que fizeste tu naquela tarde de Julho. Os teus olhos transformaram-se e revelaram uma parte de ti que eu não havia conhecido nunca. Entraram com força dentro dos meus e o meu coração agora torcido pelo castanho amêndoa que irradiava de ti dizia-me que aquela não era uma tarde qualquer: era a tua tarde de Julho, a tarde pela qual esperaste devagar para me poderes apanhar.

Afinal quem és tu, Emma Johnson? O teu cabelo louro a acariciar-te as costas, os teus olhos sem fundo como se quisesses descobrir o eu de todos para quem olhas. Os teus vestidos beges a contrastar com a tua pele de mel, as tuas calças apertadas a realçar as tuas pernas esculturais. E a tudo isto se junta o fumo que dança do cigarro aceso nos teus compridos dedos, hora sim, hora não. De onde vens tu, Emma Johnson? Quem és tu?
Levantei-me, já tarde. As noites mal dormidas desde essa tarde de Julho em que te coroaste proprietária de mim obrigam-me a prolongar o sono pela tarde fora. Arranjei-me mais bonita do que nunca, agarrei em meia dúzia de cds que estavam na mesa da cozinha e enfiei-os na carteira, pintei os lábios de vermelho e pus um sopro do meu melhor perfume, soltei o cabelo comprido e trinquei metade de uma maçã. Saí do quarto. Aquele quarto entendia-me. Todos os quartos me entendiam ultimamente, o ar parado, os mesmos lugares e os mesmos cheiros, os teus olhos de amêndoa em todas as paredes. Preciso de sair, devorar a liberdade, aprisiona-la em mim. Emma Johnson, Emma Johnson…
Sento-me na mesa do café, preta como eu estou agora, ouço o dançar das teclas de um piano desconhecido, escorre pelas colunas como a água pela rocha onde nasce. Lembro-me das tuas mãos à volta do meu pescoço, dos teus lábios perto de mim, a darem-me a esperança da tua devoção eterna. Emma Johnson, quem foste tu? Agora que me obrigas a vestir de preto, agora que não te verei nunca mais, quero saber quem és. Exijo saber quem és, agora que as teclas do piano que costumavas tocar para mim já de nada me servem, agora que o café já a nada me sabe. A minha única ajuda reside nos cigarros que respiro na expectativa de trazerem algo de ti escondido no seu fumo, na esperança de que ainda vivas no arder da ponta de um deles e de te poder voltar a ter dentro de mim.
O vapor que se eleva – agora do café já quente – tem tanto de alegórico como a tua aparição em mim. Acordo da pancada, levanta a pálpebra, contrai a pupila, ergue-se o corpo e aqui estou eu. Emma quê…?

To Be Alone With You - Sufjan Stevens (clicar para ouvir)

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