sábado, 19 de abril de 2008

Estava Agora Nas Mãos De Uma Criança .


Nascer. Ninguém o faz de ar e vento, e ninguém tem poder algum para o fazer. Ninguém tem a possibilidade de nascer por si próprio, está tudo nas mãos de outrém, mais velho, mais experiente. O facto de estar presente no mundo não é da nossa responsabilidade, afinal, ninguém quis realmente pertencer-lhe. Foi somente obrigado a fazê-lo. Não me lembro, de todo, de dizer à minha mãe que queria vir morar para aqui, para junto de outras pessoas nascidas e para um mundo que pouco a pouco mais escuro se ia tornando. Não me lembro de lhe pedir uma casa redonda onde a grande maioria dos habitantes me eram desconhecidos. Não me lembro, de todo, de lhe dizer que queria nascer. De facto, nos últimos anos aprendi que nem tudo está nas nossas mãos. Estive com a minha mãe, protegida da luz e do escuro, do frio e da neve, durante nove meses. Não me lembro, também, dessa fase da minha vida. Mas a verdade é que existiu. O facto de estarmos dentro de alguém, de não virmos todos da mesma máquina produtora de objectos, torna cada pessoa única. Mas não a única. Somos muitos, talvez demais até, mas isso já não faz grande diferença, tudo se tornou uma rotina e vamos vivendo em harmonia, pouco a pouco, vamo-nos habitando às diferenças, ao facto de não virmos todos da mesma máquina produtora de objectos.

Renascer. E de repente, sinto que já nada faz sentido. Tudo o que batia certo até agora, deixara então de ter razão. Olhava à minha volta e via que não, que não existia a rotina e a habituação às diferenças, que afinal todos os respeitados provinham da mesma máquina produtora de objectos. Isso magoava-me, fazia-me culpar também a minha mãe por me ter dado esta casa redonda, esta casa que eu nunca lhe pedi. Será que também eu era assim, uma dessas pessoas vinda de uma máquina produtora de objectos? Não, eu não podia. Não podia de todo. E hoje a minha mãe já nada podia fazer, estava somente nas minhas mãos Renascer.
P.S. The children start to march , Against the world in which they have to live , And all the hate that's in their hearts , They're tired of being pushed around .
P.P.S. Turn The Page , Metallica .

5 comentários:

Anónimo disse...

mmmm.
Nunca pior.
Mas ainda náo estou convencido, obviamente.
Podes continuar a tentar provar que és melhor que eu mas não vais conseguir.
É a vida
Bjs

R. Branco disse...

Renasce Renasce, estou aqui para te segurar e ouvir o teu primeiro choro

Anabela Magalhães disse...

Ó R. Branco, e se fosses menos convencido?

Anónimo disse...

Eu não sei se "convencido" é a palavra certa!
Parece-me um pouco branda.
Mas quem sabe?

Elsa C. disse...

Não podemos evitar nascer. Não podemos evitar morrer. Podemos decidir como queremos viver: como autómatos sedentos do Nada ou como seres que se constroem a partir do nada.


Admirei a profundidade da frase da Anabela Magalhães: "As definições não são definitivas." E ainda bem porque os dogmas são/serão sempre estáticos, meras clausuras mentais que afectam universo social das relações interpessoais.
Uma vida "definitiva" seria uma contradição, um contra-senso. Felizmente.